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Burnout e Subjetividade: pressão neoliberal e esgotamento profissional

19 de agosto de 2025 | israelrienzopsicologo.com.br

A Síndrome de Burnout, ou esgotamento profissional, não é apenas um fenômeno individual; ela reflete as tensões de um contexto social e econômico que captura corpos e subjetividades. No Brasil, estima-se que cerca de 30% dos trabalhadores apresentem algum grau de Burnout (COFEN, 2022). Caracteriza-se por exaustão física e mental, desmotivação, insônia, dores musculares e sensação de incompetência (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2025), evidenciando não apenas sofrimento psíquico, mas também o impacto direto das demandas externas sobre a vida interior do sujeito.

O Conselho Regional de Psicologia de São Paulo (CRP-SP) destaca a relevância do tema, especialmente no contexto educacional. Em sua publicação Psicologia e Educação – Ano da Educação, aponta que entre 9% e 10% dos professores da Educação Especial abandonam a escola devido ao Burnout, enquanto 6% dos docentes da educação regular também enfrentam essa condição (CRP-SP, 2023). No entanto, a Síndrome de Burnout não se limita ao setor educacional; ela é uma questão ampla de saúde ocupacional, afetando profissionais de diversas áreas. Estudos científicos evidenciam sua presença em setores como saúde, tecnologia, serviços e finanças. Por exemplo, profissionais de saúde, como enfermeiros, enfrentam altos níveis de estresse ocupacional, com a Síndrome de Burnout sendo um dos possíveis efeitos da exposição crônica ao estresse (PePSIC, 2020). No setor de tecnologia, a adoção do trabalho remoto durante a pandemia aumentou a incidência de Burnout entre desenvolvedores, devido à intensificação das demandas e à dificuldade de estabelecer limites entre vida profissional e pessoal (LUME, 2020). Profissionais de serviços, especialmente aqueles em funções de cuidado, estão particularmente vulneráveis ao Burnout, dado o alto nível de envolvimento emocional exigido em suas atividades (Revista Brasileira de Medicina do Trabalho, 2020). No setor financeiro, fatores como o conflito trabalho-família e o estresse profissional estão positivamente correlacionados com a Síndrome de Burnout, conforme estudo realizado com profissionais da área financeira (Santos, 2020).

A inclusão do Burnout na CID-11 pela OMS como doença ocupacional (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2025) reforça a necessidade de atenção ao fenômeno. No Brasil, a Norma Regulamentadora NR 1 obriga empresas a identificar e gerenciar riscos psicossociais, enquanto a Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (PNSTT) propõe ações de promoção e vigilância em saúde no trabalho (BRASIL, 2025; BRASIL, 2012). Essa atenção se torna ainda mais relevante diante do contexto neoliberal, no qual a pressão por produtividade e desempenho captura subjetividades, transformando desejos e necessidades internas em metas, tarefas e números mensuráveis.

Os sintomas do Burnout — exaustão, desmotivação, isolamento, irritabilidade e dores físicas — podem ser compreendidos como respostas do corpo e da mente a uma sobrecarga que não é apenas técnica, mas também ética e subjetiva. A constante exigência de produtividade e a valorização de resultados mensuráveis, muitas vezes inalcançáveis, produzem uma dinâmica na qual o sujeito internaliza a pressão externa, sentindo culpa ou inadequação diante do próprio ritmo e limites.

O diagnóstico é realizado por meio de avaliação clínica, após a qual o psicólogo ou psiquiatra pode orientar a forma mais adequada de tratamento, que pode incluir psicoterapia, tratamento medicamentoso ou ambos (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2025). Para além das estratégias clínicas, é essencial considerar o contexto social e histórico que molda a experiência do trabalho, especialmente em situações em que a sobrevivência depende do emprego. O Burnout não resulta apenas de escolhas individuais, mas também de pressões econômicas, sociais e políticas que capturam corpos e subjetividades, impondo ritmos e demandas muitas vezes insustentáveis. Reconhecer essa realidade pode permitir ao indivíduo desenvolver estratégias de cuidado e proteção — como organizar pausas, fortalecer redes de apoio, buscar acompanhamento psicológico e preservar limites — sem se responsabilizar unicamente pelo esgotamento. Essa consciência crítica pode ajudar a prevenir o Burnout, promovendo saúde física e mental, mesmo diante de condições laborais adversas.

Nesse sentido, estratégias preventivas incluem equilibrar vida pessoal e profissional, realizar pausas, manter sono adequado, praticar atividades físicas e buscar apoio psicológico. Em paralelo, a reflexão sobre o impacto do contexto neoliberal pode ajudar o sujeito a perceber que nem todas as demandas externas precisam ser internalizadas, permitindo criar fronteiras e proteger sua saúde mental e corporal.

Medidas práticas, como reservar tempo para lazer, desligar notificações fora do expediente e criar pequenos rituais de cuidado consigo mesmo, tornam-se formas de resistência subjetiva. Além disso, outras ações cotidianas podem fortalecer a prevenção do Burnout: definir pequenos objetivos na vida profissional e pessoal; participar de atividades de lazer com amigos e familiares; realizar atividades que “fujam” da rotina, como passear, ir ao cinema ou experimentar um novo restaurante; evitar contato frequente com pessoas excessivamente negativas; conversar com alguém de confiança sobre sentimentos e dificuldades; praticar atividades físicas regulares, como caminhada, corrida, bicicleta, natação ou musculação; evitar o consumo de álcool, tabaco ou outras drogas, que intensificam o desgaste mental; e não se automedicar, buscando sempre orientação profissional adequada.A prevenção do Burnout exige atuação conjunta: políticas públicas que avaliem riscos psicossociais (NR 1), programas institucionais de acompanhamento (PNSTT) e iniciativa individual de autocuidado e reflexão. Criar espaços de reflexão sobre limites pessoais e sobre como as pressões externas impactam o corpo e a mente podem permitir ao indivíduo preservar sua saúde, fortalecendo autonomia e integridade diante de exigências laborais e sociais (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2025). Além disso, é importante considerar caminhos coletivos para transformar a lógica neoliberal de exploração, como a criação de redes de apoio entre trabalhadores, sindicatos e movimentos sociais, a defesa de políticas públicas que priorizem bem-estar e direitos trabalhistas e a promoção de ambientes de trabalho que valorizem o equilíbrio entre produtividade e qualidade de vida.

Referências

BRASIL. Ministério da Saúde. Síndrome de Burnout. Brasília, 2025. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/s/sindrome-de-burnout.

BRASIL. Ministério da Saúde. Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora. Brasília, 2012. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/composicao/svsa/saude-do-trabalhador/politica-nacional-de-saude-do-trabalhador-e-da-trabalhadora  

BRASIL. Ministério do Trabalho. Norma Regulamentadora NR‑1. Brasília, 2025. Disponível em: https://www.gov.br/trabalho-e-emprego/pt-br/acesso-a-informacao/participacao-social/conselhos-e-orgaos-colegiados/comissao-tripartite-partitaria-permanente/normas-regulamentadora/normas-regulamentadoras-vigentes/nr-01-atualizada-2025-i-1.pdf.

COFEN – Conselho Federal de Enfermagem. Burnout: síndrome passa a integrar lista de doenças ocupacionais pela OMS. Brasília, 2022. Disponível em: https://www.cofen.gov.br/burnout-sindrome-passa-a-integrar-lista-de-doencas-ocupacionais-pela-oms/ .

CRP-SP – Conselho Regional de Psicologia de São Paulo. Psicologia e Educação – Ano da Educação. Disponível em: https://www.crpsp.org.br/educacao/ano_eixo1.aspx?utm_source=chatgpt.com.

LUME. A Síndrome de Burnout em profissionais de tecnologia durante a pandemia. Disponível em: https://lume.ufrgs.br/handle/10183/239081

PePSIC. Síndrome de Burnout nos profissionais de saúde. Disponível em: https://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?pid=S1516-08582020000100005&script=sci_arttext

Revista Brasileira de Medicina do Trabalho. Síndrome de Burnout e os transtornos relacionados. Disponível em: https://www.rbmt.org.br/details/46/pt-BR/sindrome-de-burnout

SANTOS, S. C. S. A. Conflito trabalho-família, stress profissional e síndrome de Burnout: um estudo sobre os profissionais da área financeira. Lisboa: Universidade de Lisboa, 2020. Disponível em: https://repositorio.ulisboa.pt/handle/10400.5/20914.

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